Wednesday, December 07, 2005

Teologia da Libertação – a América Latina polemizando


Surgida das quatro Conferências Gerais realizadas pelo Episcopado da América Latina – no Rio de Janeiro em 1955, em Medellín em1968, em Puebla em 1979, e em Santo Domingo em 1992 – a Teologia da Libertação reconhece na conjuntura dos primeiros anos da década de 60 seu nascedouro, no contexto da cunhagem da terminologia "subdesenvolvimento".

Fruto de uma estreita associação entre as linguagens da teologia e da sociologia, sobretudo de orientação marxista, a Teologia da Libertação emerge na esteira das reformas proclamadas pelo Papa João XXIII em conjunto com o Concílio do Vaticano II (1962/1965), introdutor de uma série de medidas modernizantes na Igreja Católica. Valorizando movimentos leigos, propondo uma maior interação entre os indivíduos do clero e incentivando o seu envolvimento em questões sociais, acredita-se que a Igreja adotava, finalmente, uma orientação em torno da construção de uma base popular de apoio às articulações eclesiásticas, para alguns, a grande deficiência da Igreja Católica no Brasil. Apesar de tipicamente européia, a reforma foi obter grande repercussão no contexto sócio-cultural da América Latina da época.

Essa repercussão e a natureza da nova corrente teológica se expressam com clareza nas palavras de Clodovis Boff, um dos expoentes da Teologia da Libertação no Brasil: "A América do Norte, em especial os EUA e os países europeus, sempre impuseram aos latino-americanos seus valores, suas políticas, sua cultura, etc. Nesse sentido, a libertação no seio da América Latina é a luta pela liberdade de sua cultura, valores, economia e política frente às diversas opressões advindas de uma modelo imperialista que rege a práxis do hemisfério norte em suas relações com o sul". Permeado de terminologias características, o trecho deixa claro o predomínio da ideologia marxista na análise social feita pela nascente corrente teológica. A justificativa para tal fica por conta dos dados de extrema desigualdade social que historicamente assolam a região, e que servem à alegação dos defensores da TL de que fazer uma teologia que ignorasse o sofrimento real dos povos latino-americanos significaria fazer uma "teologia de condomínio", fechada à realidade e restrita às minorias.

Diante de sua natureza intrinsecamente ambígua, a grande discussão travada acerca da nova corrente diz respeito à essência de seu conteúdo, que oscila entre a exaltação de uma fé fiel aos princípios da Igreja, orientada sobretudo pela exaltação do Deus bíblico defensor da justiça (social) e da fraternidade, e por isso não mais fonte de discursos etéreos (mas sim transformadores); e à crítica de uma suposta redução da fé ao discurso político, ligado ao perigo vermelho, bastante significativo na conjuntura de seu nascimento, a Guerra Fria. Pregando a libertação como valorização da paternidade de um Deus que não mais se encontra numa esfera trans-histórica, mas que se apresenta constante na práxis do povo que luta pelo fim de toda opressão e, portanto, pela dignidade humana, a Teologia da Libertação, permanece até os dias atuais marcada pelas veementes críticas a seu caráter anti-conservador, principalmente com relação à tradição da própria Igreja. Seus teólogos de destaque no país são Leonardo Boff (irmão do já citado Clodovis Boff), Carlos Meister e Frei Betto.

A despeito das críticas, a Teologia da Libertação, se encarada como um símbolo de manifestação sócio-religiosa-cultural própria da América Latina, indubitavelmente constitui um dos marcos da lenta e reticente ascensão do continente às esferas mundiais de atuação e discussão. Por fim, é preciso salientar o fato de que, em meio às diversas vozes simultaneamente ouvidas durante o conturbado século XX, América Latina se fez notar não somente nos âmbitos político ou econômico e não apenas por concordar ou prestar seu apoio, mas também por ser capaz de contestar.

Por Fernanda Pernasetti de F. Figueiredo

1 Comments:

Blogger Anna Carol said...

Será Daniel? O que fez você chegar a essa conclusão? Ele só vai morrer se nós deixarmos..

7:06 PM  

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