Wednesday, October 12, 2005

“O CADÁVER VIVO”

Ruth Benedict, autora de “The Chrysanthemum and the Sword” (O Crisântemo e a Espada), foi uma antropóloga renomada, contratada pelos Estados Unidos, em 1944, com o objetivo de estudar a cultura japonesa. Naquele tempo, havia um grande dilema em relação ao pós-guerra no Japão: Como reagiriam diante de uma derrota? Outra questão seria qual tipo de governo melhor adequaria os japoneses aos objetivos dos americanos. Através da obra, a autora advoga o seu ponto de vista sobre a postura ética e cultural desse povo tão controverso.

O título da obra, que oferece o contraste entre uma flor e uma arma, pode sugerir uma idéia paradoxal. De fato, reconhecendo que cada cultura é uma lente através da qual as pessoas enxergam o mundo, para os ocidentais, os homens que lutaram até o fim, munidos de bambu; contrastam fortemente com os mesmos que receberam os americanos no pós-guerra com tanta cordialidade, aceitando a derrota sem pestanejar.

Contudo, apreende-se que as motivações japonesas são circunstanciais. Para os desconhecedores da cultura japonesa, várias interpretações podem ser dadas, desde dupla personalidade até hipocrisia. Como a cultura ocidental poderia interpretar prisioneiros de guerra que colaboravam fortemente com os inimigos, sem ter aparentemente algo em troca? Um dito explica essa flexibilidade: “viver como se estivesse morto”.

A tradução americana para esse dizer é “cadáver vivo”, pois ao “pé da letra” é o que realmente significa. Porém, essa afirmativa tem razões mais profundas na vida de um japonês que possui um rígido código ético e o medo constante da desonra. Para eles, guardando dentro de si seus impulsos ou paixões, estão livres da humilhação alheia. Tal humilhação poderia ser fatal, resultando, nos casos mais extremos, no suicídio. O seguro seria viver por atitudes mecanizadas, preestabelecidas por seu rígido código de honra. Através de tais atitudes, seriam aceitos pela sociedade, adquirindo o respeito dos mais próximos, pois, no Japão, a aceitação incide no macro e só depois reflete no micro.

De acordo com a ética japonesa, a aceitação e o respeito pela hierarquia são costumes incontestáveis. Da mesma forma, a reciprocidade, a honra ligada ao nome, os diversos tipos de obrigações, dentre outros. Dessa forma, qualquer desrespeito à essa ética é motivo para uma atitude hostil, uma vingança; de pacíficos tornam-se assustadoramente violentos até igualarem a resposta à agressão sofrida. De expositores de crisântemos e “cadáveres vivos”, apáticos; revivem os Samurais de outro tempo ou transformam-se nos kamikazes da Segunda Guerra.

A mesma honra japonesa pode ser infinitamente briosa e merecedora de reverência. São extremamente leais e honestos, dignos de confiança mesmo nas promessas feitas ao inimigo. Durante muito tempo, empregaram esse mesmo código à política externa, não humilhando os derrotados, a não ser que ofensas graves tenham sido direcionadas ao Japão. Da mesma forma, que após a rendição, aceitam o papel lhes dado pelos EUA, colocam-se no seu lugar.

Através de um raciocínio realista, souberam aproveitar as oportunidades oferecidas, e perseverantes, acreditaram que o seu momento chegaria. E, através dessa atitude tão controversa, reconstruíram seu país, sob a supervisão americana; chegando ao status tecnológico, que podemos comprovar no século XXI. O “cadáver vivo” funcionou como uma tática para que alcançassem o posto dos dias atuais; chegaram a um patamar inimaginável para um país devastado pela guerra e pela bomba atômica.

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