Thursday, November 03, 2005

O Grande Chaplin

O filme "O Grande Ditador" começa nos campos de batalha da Primeira Guerra Mundial onde um barbeiro judeu (Chaplin) que tinha se tornado soldado da Toumania (Alemanha) salva um alto oficial da aeronáutica, o Comandante Schultz.
Após a guerra, há uma breve referência a eventos que marcaram os anos seguintes: a Grande Depressão, as revoltas populares, e finalmente, a ascenção de Hynkel (Hitler) acompanhada pela supressão das liberdades civis. Em seu discurso, Hynkel critica a democracia, a liberdade de opinião e torna-se extremamente agressivo quando se refere aos judeus.
É retratado então a vida dos guetos onde os judeus sofriam as mais diversas humilhações provocadas pelas tropas de Hynkel. Um belo dia, o Cº Schultz é pego no gueto tentando articular um complô contra o governo com o seu amigo barbeiro e seus outros vizinhos judeus. Ambos são então enviados para um campo de concentração.
Enquanto isso, Hynkel planeja invadir Osterlich (Áustria), no entanto o ditador da Bactéria (Itália), Napaloni (Mussolini), envia 60 mil homens do seu exército para a fronteira - fato histórico que realmente aconteceu antes do Anschluss. Hynkel convida então Napaloni para Toumania com o propósito de resolver o impasse. No encontro, os dois são completamente ridicularizados, principalmente quando estão a sós com seus ministros discutindo o acordo, momento no qual mais se parecem com duas crianças baderneiras e mimadas.
Já o barbeiro, ao fugir do campo de concentração com Schultz, ambos disfarçados de oficiais, é confundido por outros soldados com Hynkel que também estava perto da fronteira de Osterlich pronto para a invasão.
O barbeiro é portanto conduzido a fazer um discurso que deveria marcar o início da expansão da Toumania. Nessa cena, clímax do filme, o barbeiro fala se dirigindo a todos os seres humanos, independente de raça ou religião. Chaplin diz então através do seu personagem que "a ambição envenenou a alma do Homem" e nos chama a atenção para os impactos das máquinas na vida humana. Segundo o ator, "pensamos demais e sentimos de menos" e ele propõe: "ao invés do ódio, amor e felicidade", "mais do que máquinas precisamos de humanidade, mais do que inteligência precisamos de bondade e compreensão"; e por isso, mesmo se inventamos o rádio e o avião, para realmente nos aproximarmos uns dos outros, precisamos da fraternidade. O discurso de Chaplin aproxima-se inclusive do texto "Fascismos" de Teixeira da Silva, quando o ator nos diz: "não odeiem, só quem não é amado tem a capacidade de odiar". De forma ousada, ele afirma ainda que "homens-máquinas com máquinas no cérebro e no coração, todos os ditadores morrerão" e finalmente, em nome da democracia, Chaplin conclama o poder do povo para lutar por um mundo de liberdade e felicidade universais.
Na última cena, Hannah, namorada do barbeiro que havia se refugiado em Osterlich, ouve os ecos desse "novo mundo" de um futuro glorioso.
Essa obra-prima de Chaplin impressiona. Sobretudo, pela capacidade genial com a qual o ator consegue provocar, além dos risos do público, uma denúncia, um afrontamento, um desafio aos governos do Eixo e seus dirigentes. Estes últimos são ridicularizados numa sátira carregada de sutilezas, como por exemplo o pseudonome da Itáila - Bactéria - que revela o caráter oportunista da diplomacia italiana, ou ainda, a enorme semelhança entre o barbeiro judeu e Hynkel. O filme é também permeado por referências a fatos históricos, como por exemplo a mobilização instrumental das massas. No final, Chaplin é contumaz ao defender a primazia da razão sobre o militarismo, fazendo corajosamente um discurso universalista em pleno ano de 1940, momento de vitórias do Eixo...

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